Marcílio Mota

Marcílio Mota

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

A INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL DA COMPETÊNCIA DAS VARAS DO TRABALHO

A INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL DA COMPETÊNCIA DAS VARAS DO TRABALHO

Compartilho a introdução e as conclusões de texto recentemente publicado na Revista do TRT6.

INTRODUÇÃO
Discorremos, no presente texto, sobre a competência territorial das Varas do Trabalho, tema sobre o qual os manuais e cursos não se debruçam de modo a explorar toda a sua potencialidade, o que é justificável pelos objetivos dos cursos e manuais de processo do trabalho.
Notamos, por outro lado, que no quadro atual da ampliação da competência da Justiça do Trabalho não houve uma consideração, por parte dos estudiosos, das possibilidades que surgiram para a definição da competência territorial das Varas, em vista de que as regras da Consolidação das Leis do Trabalho tratam da competência territorial para os conflitos que decorrem da relação de emprego, uma das espécies de relação de trabalho que agora são postas ao conhecimento da Justiça Especializada.
Assim, impulsionam-nos tanto a superficialidade no trato do tema pela doutrina, quanto a lacuna no tratamento da competência territorial para os conflitos que decorrem de relação diversa da relação de emprego.
A nossa abordagem, ademais, considera o tema no contexto do acesso à justiça propondo uma interpretação das regras vigentes em torno da competência territorial das Varas do Trabalho que tenha em vista a garantia constitucional.
Objetivamos, assim, aprofundar as ideias em torno do tema, suprir uma lacuna relativamente à competência das Varas para os conflitos que decorrem de relações de trabalho outras que não de emprego e contribuir para uma interpretação das regras que concretizem a garantia do acesso à justiça.
No capítulo inicial tratamos das regras que disciplinam a competência das Varas para as relações de emprego. Damos destaque, assim, às regras do art. 651 da CLT. Na sequência, discorremos sobre a competência territorial das Varas para os conflitos que não decorrem da relação de emprego, as quais desde a Emenda 45 estão postas ao conhecimento da Justiça do Trabalho.
Suscitamos, nesse ponto, a necessidade do preenchimento de lacuna normativa no processo do trabalho. Apresentamos, então, as situações para as quais será necessário o socorro das regras do processo civil comum.
No capítulo seguinte, consideramos o princípio-garantia do acesso à justiça buscando o seu significado e conteúdo.
No capítulo que antecede as nossas conclusões, propomos uma interpretação da competência territorial das Varas que tome em consideração o princípio-garantia do acesso à justiça, desde a consideração de que as regras celetistas e do processo civil comum têm a preocupação com o acesso à justiça do mais fraco na relação de direito material e a necessidade de obtenção de provas que permitam um julgamento justo.
É nesse capítulo, pois, que propomos uma interpretação que eventualmente ultrapasse a literalidade das regras; que reconheça o foro de eleição como possível nas contratações de trabalho; e que admita ao juiz do trabalho a pronúncia de ofício da competência territorial, desde que ajustes das partes em torno da competência tenham sido prejudiciais ao acesso à justiça do mais fraco na relação de direito material.

CONCLUSÕES
A Justiça do Trabalho foi concebida para a solução de conflitos entre trabalhadores e empregadores, situação que permaneceu na legislação nacional até o advento da Emenda 45, que ampliou a competência da Justiça Especializada para todos os conflitos que decorrem das relações de trabalho, excluídas as relações de Direito Administrativo que as pessoas de direito público mantêm com servidores.
A competência territorial das Varas do Trabalho, nesse passo, que data da década de 40 do século passado, foi prevista, então, para os conflitos que decorrem das relações de emprego. As regras que encontramos no art. 651 da CLT consideram que um empregado esteja num dos polos da relação processual.
Tendo em vista a ampliação da competência da Justiça do Trabalho e a lacuna na legislação específica em torno da competência territorial das Varas do Trabalho para os conflitos que decorrem de relações que não sejam de emprego, necessitamos da utilização das regras do processo comum, em caráter subsidiário por previsão do art. 769 da CLT, as quais consideram o local do domicílio ou residência do réu, o local da sede da pessoa jurídica ou da agência ou filial demandada, o local do adimplemento da obrigação cuja satisfação se busca e o local do ato ou fato para as ações de indenização por dano.
O princípio-garantia do acesso à justiça, consagrado no item XXXV do art. 5º da Constituição Federal, é interpretada sob vários aspectos pela doutrina nacional.
A garantia é interpretada em seu aspecto negativo de impedir que o Poder Público e os particulares criem obstáculo a que qualquer pessoa tenha acesso ao Judiciário diante de uma ameaça ou lesão a direito. Por outro lado, também é apontada em seu aspecto positivo, como uma previsão que implica na necessidade de que a sociedade crie condições de efetivo acesso à justiça de todos quantos tenham demanda por solução de conflito.
A constituição em vigor ampliou o princípio na medida em que não o restringiu à defesa de direitos individuais e o previu para a hipótese de ameaça a direito, o que na prática se tinha com a possibilidade das medidas cautelares e de antecipações de tutela, essas últimas para casos específicos até a alteração da regra do art. 273 do CPC.
Ademais, a doutrina considera que o acesso à justiça deve compreender a ideia de adequado acesso, ou seja, que corresponda à realidade da situação jurídico-substancial que lhe foi submetida.
Nesse contexto, destarte, merece destaque a posição de Cintra, Dinamarco e Pellegrini (2009), que desenvolvem uma compreensão sistemática do acesso à justiça, a qual não se identificaria com a mera admissão ao processo, ou seja, com a sua universalização, mas também com a efetivação do devido processo legal; a partir da participação dos litigantes no processo, com o que possam atuar decisivamente para a formação do convencimento do órgão jurisdicional; e pela possibilidade de que os litigantes participem em diálogo na preparação de uma solução judicial justa para o conflito.
A instrumentalidade do processo, que corresponde à concretização dos direitos pela via do acesso à justiça, é mais um destaque da doutrina nacional para a garantia do acesso à justiça, o que nos parece de grande relevância, na medida em que se ressalta o acesso como um mecanismo de concretização dos direitos consagrados a partir da Constituição Federal, revelando opções favoráveis aos interesses sociais.
A interpretação da competência territorial das Varas do Trabalho para os conflitos que decorrem da relação de emprego destacam dois aspectos nas regras previstas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT: o acesso à justiça; e a necessidade de obtenção das provas para o julgamento do conflito, o que também, no nosso entender, corresponde a uma expressão do acesso à justiça.
Relativamente às regras em torno da competência territorial das Varas do Trabalho para os casos que não são de relação de emprego, outra conclusão não podemos extrair: elas foram concebidas no Código de Processo Civil também para permitir o acesso das pessoas à jurisdição e tendo em vista a necessidade da obtenção de provas (RODRIGUES, 2010).
De tudo se ressalta, destarte, que o princípio-garantia do acesso à justiça deve presidir toda a interpretação das regras que fixam a competência territorial das Varas do Trabalho, independentemente de que estejamos num conflito de relação de emprego ou de relação diversa da relação de emprego e, assim, a necessidade de que sejam afastadas as interpretações literais das regras de competência, em algumas hipóteses; a admissão da contratação de foro, desde que não seja prejudicial ao acesso de qualquer dos litigantes à justiça, sobretudo do trabalhador; e a necessidade de se reconhecer ao juízo do trabalho a possibilidade de manifestação da incompetência relativa, de ofício, independentemente de estarmos diante de cláusula de contrato de adesão.

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